quinta-feira, 21 de maio de 2009

4chan VS Youtube

Nos anos 80, lá no milênio passado, vários autores de ficção científica[bb] abordaram um tema que, como tudo que realmente é bom na literatura, não envelheceu: a mistura de adolescentes e computadores. O que acontece, afinal, quando uma nova geração que cresceu em meio às novas tecnologias, e sabe explorar o poder que lhes é dado por elas, decide abusar do que tem em mãos?

A visão daqueles tais escritores, em geral, não era das mais otimistas. Qualquer um com um mínimo conhecimento de psicologia sabe que a adolescência é uma fase da vida marcada pelo tédio. Nada é suficientemente interessante, nada é divertido o bastante, ninguém é tão bom quanto o necessário para um adolescente. Só há uma excessão a essa regra: o que é ilegal. Uso o termo "ilegal" aqui de maneira ampla. Não falo do que é contra a lei da sua cidade, estado, país, não apenas. Pode ser apenas uma contravenção contra as regras da sua família, do seu círculo social. O verdadeiro prazer de um adolescente, é ver o circo pegar fogo.

Mas como isso funciona numa época em que a tecnologia de informação está avançada o suficiente para que o círculo social de um adolescente seja, mesmo que "virtualmente", tão amplo que englobe pessoas de diferentes raças, credos, culturas, países? Como um grupo de jovens entediados pode gritar os palavrões que acabaram de aprender e ter certeza que o mundo todo vai escutar?

Para a ficção científica daquela década, a delinquência juvenil se tornaria um problema muito mais grave do que havia sido até então, tomando escalas globais mesmo quando praticada por um grupo pequeno. Prejuízos com carros roubados, janelas quebradas, pichações e afins são praticamente nulos quando um único canadense de 14 anos decide tirar do ar o Yahoo, o site da CNN, o e-bay e o Amazon.com com um ataque DoS (Mafiaboy, fevereiro de 2000, lembra?). Esse se tornaria o objetivo da geração entediada: deixar uma marca aonde todos pudessem ver.

Anteontem, durante a madrugada, presenciei uma guerra. Sem sono, duas da matina, entro no 4chan. Com poucos cliques me deparo com uma imagem com a logomarca do Youtube e os dizeres "Broadcast Porn". O que estava acontecendo era o que é conhecido naquelas bandas da internet como "raid". Um ataque semiorganizado a algo ou, quando há uma vítima suficientemente azarada, a alguém.

Pois bem, um grupo de algumas centenas, milhares talvez, desses adolescentes entediados e com acesso a internet decidiu encher o saco de todos os moderadores do Youtube com um plano bem simples: fazer o upload de videos pornográficos para o site, utilizar a palavra "marblecake" para o quicksearch. Enxágue e repita. Quando eu comecei a acompanhar o que estava acontecendo, o raid já estava acontecendo há 5 horas. Foi interessante observar como tudo evoluiu. A aparente falta de organização dos "anônimos" só deixava a ação mais fluida. Poucos minutos depois que os moderadores começaram a deletar todos os novos videos que eram subidos ao site com a palavra marblecake, o termo já havia sido substituído por qualquer outro termo facilmente identificável por outros 4channers. Quando a própria comunidade do Youtube começou a marcar os videos como inapropriados, os participantes do raid responderam marcando videos que se encaixavam nas regras do site para confundir e ocupar os moderadores. Quando as contas dos uploaders começaram a ser banidas, listas de centenas, literalmente centenas de contas do youtube foram disponibilizadas abertamente a quem quisesse.


A velocidade de resposta dos arruaceiros a qualquer medida tomada pela equipe do Youtube era simplesmente fantástica. A falta de burocracia na ação, o fato de todos serem iguais ali, não respondendo a um comando superior, mas apenas trabalhando juntos para um fim comum provocaria ereções em qualquer anarquista. E anarquizar, era, certamente, o objetivo do ataque.

O raid foi planejado para durar 24 horas, mas acho que durou um pouco menos. Ao entrar no tubo e buscar videos postados recentemente, o que eu via era uma lista de páginas e páginas de pornografia que, em certos casos, nem sabia que era humanamente possível de se realizar. Naquele dia, o pior emprego do mundo é certamente o de moderador do Youtube, algo BEM irônico, considerando que o Google tem fama de ser o melhor lugar do mundo para se trabalhar.

Mas o que tiramos disso tudo: 1) não questione os grandes gênios da ficção científica, eles estão certos e você ainda nem sabe ainda. Loser. 2) Não subestime o poder de fazer merda de um adolescente desocupado e bem informado.

A sensação que tenho é que vi ali uma amostra pequena e quase sem consequências da delinquência do futuro. Prepare-se para uma época em que o enfado de um único coreano cansado de Starcraft vai te causar dores de cabeça, só pra ele poder dar umas risadas. Se eu fosse você, iniciaria uma coleção de literatura cyberpunk e colocaria na estante numa seção com a etiqueta: "Guias de sobrevivência ao futuro".

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